Outro dia eu tive a chance de me sentar com um dos músicos mais renomados do nosso tempo. O alcance do trabalho daquele homem é impressionante: somados, seus álbuns já venderam mais de 100 milhões de cópias ao redor do mundo — mais que Beyoncé, Bob Dylan, Prince, Backstreet Boys, Britney Spears, Justin Bieber ou Adele.
Suas músicas somam milhões de visualizações no YouTube num piscar de olhos e ele fez, sozinho, a trilha sonora de incontáveis infâncias. Muitos são levados para um mundo completamente diferente quando ouvem seu trabalho.
Mas, embora você provavelmente reconheça a música desse homem — você deve ter ouvido por horas essas músicas, assim como várias pessoas que conheço — o nome dele é estranho para você. No entanto, vamos voltar para Jerry num segundo.
O experimento
Escrevo estas palavras rodeado pelo cochichar de uma cafeteria preenchida com um punhado de gente.
É um dia em meados de fevereiro aqui em Ottawa — diferente até então. Três semanas depois do nosso mês com maior volume de neve, agora está chovendo. A maior parte da neve já desapareceu e, embora todos os que passam pela janela devam estar ensopados pela chuva, eles não estão empacotados na sua indumentária larga e típica de um começo de fevereiro no inverno.
Se você me perguntasse qual seria uma música para descrever esta manhã, eu começaria com When we were young, de Adele. É devagar e tranquila, e, para mim, uma música muito parecida com este dia.
A música tem a capacidade de aprimorar os nossos arredores e, acredito, é melhor harmonizada com outras coisas como: um jogo de cartas, uma festa, um casamento, um drink depois do trabalho, ou um ritual de escrita matinal em um dia de chuva como este.
Alguns dias eu produzo mais quando ouço música instrumental, mas hoje já escrevi mais de 1.500 palavras ouvindo músicas como essa de Adele. Na maioria dos dias, eu coloco a música que me parece certa, e quando começo a focar no trabalho, ela vai esmaecendo e esqueço que estou ouvindo.
Essa observação me levou à seguinte questão: como a música altera nossa produtividade? Ela faz isso de alguma forma? Certas músicas, gêneros e tempos nos fazem focar melhor? Isso depende da nossa personalidade — se somos introvertidos ou extrovertidos, por exemplo? Dependeria de como você está se sentindo em um certo dia? O que diz a ciência?
Fui descobrir. E, por diversão, eu passei um mês experimentando o que eu ouvia, não só para descobrir a ciência por trás da música e produtividade, mas para explorar ideias subjetivas também.
Durante um mês, ouvi:
Música instrumental na primeira semana;
Batidas mais lentas na segunda semana;
Música pop na terceira;
Rock na quarta e;
Absolutamente nada na quinta.
Mantive um registro a cada semana de quanto foco, energia e motivação eu tive durante o dia.
Este artigo é o resultado desse experimento.
A trilha sonora mais produtiva do mundo
Antes de eu compartilhar os resultados do meu experimento, vamos voltar a Jerry.
São grandes as chances de você não reconhecer o nome de Jerry Martin — mesmo que o resultado do seu trabalho possa ser considerado uma das trilhas sonoras mais produtivas de todos os tempos.
Jerry é famoso por criar músicas para videogames como The Sims e SimCity — jogos que juntos venderam bem mais de 100 milhões de cópias no planeta.
Quando procura-se saber como a música influencia nossa produtividade, a música de Jerry é um bom ponto inicial. Afinal de contas, as composições dele são feitas para serem ouvidas durante horas a fio, enquanto você foca no jogo à sua frente.
A música dele está no background enquanto você trabalha — em vez de lhe distrair da sua tarefa em mãos. Ela é feliz e “pra cima”, e lhe mantém jogando. E não há palavras para lhe distrair.
Até onde a música vai, ela é bem produtiva.
Jerry concorda que sua música é composta para auxiliar o seu foco, em vez de ser o seu foco.
“Quando você coloca muita estrutura na música, você tende a focar nela. O melhor tipo de música existe no ambiente — realmente não existe muita coisa nela quando você a ouve de perto. A música é linear, só vai mudando sem você saber, e está apoiando o seu trabalho no jogo”.
Essa ideia é adaptada para cada jogo — a trilha sonora de SimCity tem sons mais experimentais, por exemplo — no entanto cada trilha sonora é criada com esse estilo minimalista em mente.
Jerry também adapta esse estilo musical nos comerciais para os quais produz canções – publicações para companhias como Apple, Toyota, EA, AT&T e NBA. Em ambos os casos, como ele coloca, a música “é secundária quando comparada ao visual”.
O que diz a ciência
Pesquisas em música e produtividade ecoam a mesma ideia: trabalho em primeiro lugar, música em segundo.
A música não deveria ser o nosso foco principal. Nós temos só um tanto de atenção para dar em determinado momento, e é por esse motivo que a música de Jerry nos ajuda a focar. Seu estilo é linear, minimalista e contém menos elementos que as composições complexas, o que notavelmente ajuda bem o nosso trabalho. Quanto mais complexa a música, mais as nossas mentes têm o que processar, o que afeta nosso foco quando trabalhamos.
Quando eu estava formulando este artigo, eu pensei que essa seção sobre a ciência por trás da música e a produtividade seria a mais fácil de escrever — existem incontáveis artigos sugerindo como a música pode melhorar nossa produtividade.
No entanto, a maioria desses artigos são enrolação. Eu não descobri muito, uma vez que comecei a me aprofundar nos estudos de como a música afeta nossa performance no ambiente de trabalho. Nenhum, até então, conduziu uma metanálise formal — uma pesquisa que sintetiza todas as outras pesquisas feitas — no tópico de música e produtividade.
Portanto, foi difícil encontrar uma leitura sobre o efeito preciso da música na performance no local de trabalho — a maioria dos estudos que existem são mal feitos e muitos dos que são bem feitos têm um conflito de opinião.
Cinco ideias consistentes se destacam nas pesquisas que temos disponíveis, no entanto. A seguir, elas estão numeradas em ordem de importância:
1. Música e outros barulhos no ambiente consomem parte da nossa atenção. Quanto menos complicada a música, mais conseguimos focar
O som é similar à distância, ao tempo ou ao dinheiro: é relativo. Sempre haverá momentos em que ouvir música é a atitude mais produtiva que você pode ter — como quando você está trabalhando num ambiente de trabalho que distrai sua atenção, ou quando um casal está tendo uma conversa alta quando você está lendo numa cafeteria.
No entanto, existem momentos onde a música é menos produtiva — quando no escritório, por exemplo, está relativamente calmo ou a soma das conversas que estão acontecendo ao seu redor na cafeteria caem em um limbo.
Quimicamente falando, ouvir música faz você sentir-se mais produtivo — o que estimula o seu cérebro a produzir mais dopamina — mas, no geral, você produz menos quando você vai ouvindo, pois a música nos seus ouvidos passa a ocupar uma parte da sua atenção que é limitada.
Para ilustrar, imagine que você está dirigindo e ouvindo uma estação de música clássica. O tráfego de repente fica intenso. É provável que você baixe a música para focar mais na estrada, mesmo que a música que você está ouvindo seja simples e calma. Não importa quão simples são as músicas — elas continuam consumindo parte da sua atenção.
2. Ouvir música melhora sua performance em tarefas do dia a dia
A música prejudica a performance em trabalhos que se beneficiam mais da nossa atenção completa, porém ela auxilia a performance em tarefas monótonas e repetitivas do cotidiano.
A razão para isso, de acordo com Daniel Levitin autor de A música no seu cérebro: a ciência de uma obsessão humana, é que afazeres habituais “nos deixam entediados facilmente, então a música pode melhorar sua excitação e lhe ajudar a prestar mais atenção ao trabalho”.
E mais: como suas atividades corriqueiras não consomem sua atenção completa, sobra uma parte da nossa mente para usarmos à vontade. O que descobri que é verdade no meu experimento; eu precisei baixar o volume do que eu ouvia enquanto eu escrevia ou fazia algum trabalho que me exigia mais mentalmente, mas a música tornou atividades repetitivas bem mais divertidas.
3. A música pode melhorar consideravelmente nosso humor
Como mencionei, ouvir música faz com que nosso cérebro libere mais dopamina, um químico do prazer que faz com que nosso humor melhore e nos sintamos mais felizes. Mesmo que a música consuma parte da nossa atenção, esse comprometimento pode valer a pena caso você esteja procurando um reforço de felicidade e energia — especialmente se o seu trabalho é bastante repetitivo ou não demanda tanto esforço.
O que pode tornar-se benéfico ouvir música nos intervalos; pois como a música melhora seu humor, ela vai lhe ajudar a performar melhor uma vez que você voltar ao trabalho. Pessoas felizes são 31% mais produtivas do que qualquer outra pessoa.
4. O quanto mais familiar você é com uma música, menos ela consome sua atenção
Durante meu experimento, descobri que é infinitamente mais fácil focar enquanto se ouve batidas mais lentas e música instrumental — o tipo de música que eu geralmente ouço. A pesquisa reforça isso: preferimos músicas que já nos são familiares e somos menos distraídos por elas.
Sons familiares também melhoram nosso humor e atividade cerebral mais do que batidas que não conhecemos. Achei imensamente melhor ouvir músicas que eu já conhecia mesmo no modo repetir — mesmo sons mais complexos não me distraíram tanto dessa forma.
A música não afeta nossa produção diretamente — ela afeta nosso humor e energia, o que por outro lado afeta o quão produtivo nós somos. É por isso que eu gosto de ouvir músicas instrumentais e mais lentas através do meu dia (e foi prazeroso ouvi-las durante o experimento): o que ajuda a me sentir mais calmo, deliberado e focado.
5. Pessoas extrovertidas tendem a trabalhar melhor enquanto ouvem música, no entanto ela continua a comprometer a performance
De acordo com pesquisas, a presença de distrações de distrações ao seu redor — como uma série de TV, música ou diálogos — quase sempre atrapalha a performance de pessoas introvertidas mais do que as extrovertidas.
Dito isso, o efeito é moderado mas não extremo, e extrovertidos experienciam uma falha na performance também. A música tem se mostrado especialmente prejudicial ao foco e produtividade de introvertidos que são geralmente mais ansiosos que a maioria.
Meu mês de música
Quando você pede a alguém para refletir como eles foram produtivos em um dia, eles vão habitualmente procurar por sinais. Esses sinais são normalmente baseados na quantidade de energia que eles tiveram ou se eles estiveram muito ocupados. Mas esses não são indicadores reais do quanto eles realizaram no dia.
Você não pode culpá-los: é difícil mensurar produtividade quando você trabalha com conhecimento. Mensurar o quanto você foi produtivo é mais complicado quando você não pode contar exatamente quantas coisas você produziu em uma linha de produção.
É por essa razão que estudos sobre música e produtividade podem ser incertos. Alguém que ouviu música o dia inteiro vai quase sempre reportar que foi mais produtivo que o normal — não necessariamente porque eles realizaram mais atividades, mas porque a música que eles ouviram lhes deram mais energia.
Foi difícil evitar essa armadilha no meu experimento. Entretanto, posso facilmente reportar que completei mais atividades durante as semanas de músicas lentas e clássicas — nesses dias, eu escrevi um grande número maior de palavras, conduzi mais entrevistas e tive um nível maior de produção no geral.
Mas isso tem mais a ver com o poder das músicas minimalistas e familiares do que necessariamente com o estilo de música. Para mim, a semana da música pop foi a pior — a música era complexa, não estava familiarizado e se eu ouvisse Hit Me Baby One More Time… Quando foi rock, tudo correu normalmente — mesmo as músicas sendo complexas, eu já as conhecia.
A semana sem música foi um inferno. A música tem sido parte da minha vida há anos — tanto que raramente percebia que estava ouvindo música durante o dia.
Nessa semana senti como se estivesse olhando vitrines sem dinheiro algum no bolso — sabendo que não poderia ouvir música me fez querer mais aquilo, o que me distraiu das atividades em mãos (e isso sem contar aquelas músicas-chiclete que impregnaram na minha cabeça essa semana).
Na maior parte dos dias eu escuto música desde quando acordo até a hora de ir dormir — meu dia é incompleto sem ela. Eu só desligo a música durante meus trabalhos mais dispendiosos.
Assim como a pesquisa sugere, eu era mais produtivo quando ouvindo músicas conhecidas e minimalistas e quando as ouvia durante atividades que não exigissem minha atenção total.
O resultado final é simples: independente do contexto, se você quer ouvir música, ouça sons que já são do seu conhecimento, aqueles menos complexos.
Eu gosto de ouvir as trilhas sonoras de Jerry enquanto estou trabalhando — elas bloqueiam as distrações no meu ambiente de trabalho, ajudam a melhorar o meu humor e é uma audição que não requer nenhuma atenção ativa. No entanto, ainda assim eu diminuo o volume quando realmente preciso focar no meu trabalho.
Se seu trabalho não requer muito da sua atenção, ouça músicas que você já conheça — especialmente se você é uma pessoa extrovertida. Fazer isso vai melhorar seu humor, vai tornar seu trabalho mais divertido e sua performance não vai ser prejudicada.
Talvez valha a pena, no entanto, desligar a música se você estiver fazendo um trabalho que exija muito da sua mente e se seu ambiente não tiver distrações.
Seu trabalho vai se beneficiar dessa atenção extra.
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